sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O "amor" e não poder vencê-lo

Hoje eu já não caibo em mim. Meus olhos reluzem uma solução de água e sais que me ofusca a vista e, só de teima, fica ali, salvando minhas dores de serem enxurradas.
Por mais que eu fuja do amor ele sempre dá um jeito de me encontrar - a razão e o coração brigando de navalha nos dentes e a alma se debatendo, tentando descobrir se existe algum lugar mais baixo que o chão.
Durante um mês inteiro fiz um regime, cortei carboidratos e tudo aquilo que provocasse o amor, mas infelizmente, durante esse mês, tudo que consegui perder foram trinta dias da minha vida e um bocado de força imunológica.
Eu não tenho como me esconder dele, por mais que eu tente, ele sempre me acha. O “amor” está nos dentes brancos dos comerciais, no café amargo com quatro colheres de açúcar, no mico-leão da nota de vinte e até no tempero/canção brega que a dona de casa usa pra dar gosto ao feijão. O único problema de me juntar a ele, o amor, é que assim estarei admitindo que não posso vence-lo - não poder não é o problema, o problema é admitir.
Minha salvação é que em tempos de pornografia virtual ninguém mais precisa ser amado para amar. Sentimentos platônicos voltaram com tudo nessa estação – felicidade 24h por dia ou garantimos a devolução do seu esperma.
Sites de relacionamento, e-mail com peitinho, chá das cinco... é tudo a mesma merda. O mundo, hoje, não apenas me condena como também me executa e eu, nessa prontidão sem fim, não apenas vou fingindo que sou rico, mas também, de esperto que sou, finjo ser bobo e, o amor, de malvado que é, finge que acredita.

Pormenorização fragmentada

Quando você acha que a sua vida está boa, você começa a entendê-la. Ai é que complica tudo.
Ver seus sonhos baterem de cara no muro da razão não é para os fracos. Ou talvez até seja, de repente os fortes tem sonhos feito eles, capazes de quebrar qualquer muro, tijolo-por-tijolo, até ficar só o pó.
Vez ou outra, tenho espasmos de sanidade e me deparo com questões obvias da vida... tão obvias que nem consigo achar resposta. Porem eu logo me controlo, faço um esforcinho e volto à minha alegre-ignorância.
Alguns dos meus momentos de insanidade-invertida deixam marcas. Marcas que eu mesmo faço, rasguinho-por-rasguinho, em toda a extensão do meu peito tentando extrair, assim, qualquer resquício de amor. Amor esse que eu só encontro depois de um ou dois litros de sangue A menos no meu corpo. Fico deitado, imóvel, no chão, me fingindo de morto pra ver se assim Deus vem falar comigo. Ele sabe que eu não acredito nele, mas um dia eu ainda provo pra mim mesmo que estou errado.
Enquanto isso eu fico esperando. Esperando o desespero de esperar sentado e me iludindo, achando que a única semelhança entre eu, sucedido estelionatário de ilusões, e o pobre operário de construções é o sufixo que nos rege.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Fui só pra ver como volto

Ali estou eu, assistindo da primeira fila minha própria morte, fazendo uma diligencia do meu eu. Estou sozinho num quarto escuro pensando em por que diabos minha vida teve que ser tão regrada... deixar de fazer o que queria é do que mais me arrependo nessa hora, mas também não deixo de pensar se eu realmente quis as coisas certas. Até que ponto então fazer ou não fazer algo foi certo ou errado? minha vida sempre foi cheia dessas questões que só agora eu consigo ver o quão estúpidas são.
Ainda posso sentir que está frio, o lençol verde que me cobre não é suficiente pra me aquecer essa noite, tampouco as lembranças de todos os momentos quentes da minha vida. Eu nunca fui muito católico mas me entristece o fato de não ter um padre pra me dar a extrema unção pois já estou in articulo mortis. Só porque eu nunca acreditei em Deus tinha Ele que deixar de acreditar em mim? toda minha vida me chamaram de Salvador e agora, na hora que eu mais preciso, não posso salvar a mim mesmo e não há ninguém pra me salvar.
Eu sempre ouvi falar que quando estamos prestes a morrer nossa vida passa diante de nossos olhos e eu agora vejo tudo preto, será que é isso a minha vida, a mais pura ausência de cor? afinal eu não vejo a luz branca no fim do túnel, eu não vejo o túnel, não vejo nada...
Meus amigos, os poucos que tenho, devem estar todos ocupados, afinal todos eles tinham algo pra fazer, um estimulo para continuar lutando, coisa que eu nunca tive. Talvez tenha sido por isso que a minha vida foi se acabando, de tanto ficar quietinho no meu canto, parado, ela foi se acostumando assim. Minha vida foi achando que viver era isso, não fazer nada e então a morte, para ela, é o ápice da vida.
Não tenho nenhuma mulher pra chorar por mim nesse momento. Todas que tive foram, na minha vida, pequenas parasitas que sugaram tudo de bom que tinha em mim. Meu carinho foi com uma, meu respeito foi com outra, minha dignidade, minha alegria e a ultima de todas levou consigo só o que sobrava, meu pequeno coração que por ela insistia em bater. Nem senti muita falta dele, afinal ele foi com sua verdadeira dona.
Talvez o meu problema tenha sido minha bondade excessiva, nunca tive coragem de roubar nada disso que me foi tomado pra refazer o meu eu.
Penso agora em todos os cigarros que não fumei, em todos os foras que dei e todas as canções que não cantei. Quantas mais vão vir depois que eu morrer? minha modéstia me faz pensar que o mundo vai seguir e eu não vou estar lá pra ver, mas tudo aquilo que eu aprendi com os falsos filósofos da tv me faz pensar, em contra-ponto, que o mundo pode acabar ali, no exato momento da minha morte. Se não acabar o mundo inteiro, pelo menos o meu mundo eu sei que vai acabar e se serve de consolo sei ao menos que não vou levar a vida de ninguém comigo, afinal ninguém habita esse lugar cheio de chuva e neblina.
E minha morte é isso, um dia nublado com leves pancadas de chuva. Não posso nem ao menos dizer que meu apocalipse particular é como esses de filmes onde o dia vira noite e uma grande tempestade devasta tudo que passa por seu caminho. Os “cavaleiros” que vem ao meu encontro são simpáticos homenzinhos que montam suas bicicletas e me perguntam se não quero carona. Dizem aquilo como se minha resposta não fizesse muita diferença. Se eu aceitar ir, tudo bem, se não, não. Mas se eu não aceitar ir faço o que? depois de todo esse alarde que fiz pra mim mesmo com essa coisa de morrer, não posso simplesmente levantar e sair andando por ai. Ta certo que não fará muita diferença, afinal minha honra dever ter ido junto com alguma das parasitas que cruzou meu caminho.
Será que vale a pena manter minha palavra uma ultima vez? eu até que quero morrer mas tenho que entregar um trabalho pra faculdade amanha. Não posso faltar na ultima avaliação do semestre com uma desculpa fajuta dessas.
Eu quero ter reconhecimento em minhas obras e sei que fica muito mais fácil depois de morto, ainda mais se eu morrer jovem assim. O problema é que eu ainda não tenho nenhuma obra. Mas de repente eu posso ser lembrado por alguns em alguma conversa de esquina, alguém pode lembrar do Salvador, aquele cara simplório que tava sempre ali na volta, nunca fez mal a ninguém... com alguma sorte alguém pode até lamentar minha partida.
Já deve ser mais de nove e meia e meu corpo moribundo e cheio de ossos faz companhia a minha mente afetada por todas as besteiras de verso de caixa de cereal e ondas de microondas. Sinto meu crânio cada vez mais apertado por todas as palavras que nunca consegui dizer, sinto minha consciência querendo fugir de mim – “Não, fica aqui. Me faz companhia só mais um pouco.”. É o que digo pra ela tentando fazer com que não me privem dessa que pode ser minha ultima escolha. Viver ou não.
Eu sempre tive insônia mas justo hoje sinto que dormir cairia bem. Mas e se eu não acordar mais? nem me preocupo, todo o café que tomei na minha curta vida deve ser suficiente pra me manter com os olhos vidrados por pelo menos mais uma década.
Sinto também os mosquitos me picando para extrair o pouco sangue que ainda resta no meu corpo frio, fazem isso como se estivessem vingando cada pequeno mosquitinho que eu matei. Fico até feliz com isso, pelo menos sei que ainda estou vivo.
Viver... eu pensando tanto sobre isso e acho que nem sei direito o que significa. Será que isso que eu venho praticando ao longo dessas duas décadas é mesmo “viver”?