quarta-feira, 4 de junho de 2008

Nós Três

Aí o dia clareou, o remendo se rasgou, e a chuva, mesmo querendo, não molhou. Na verdade, quem queria era eu. A chuva só batia-e-pingava, ela molhava, mas eu secava.

O ruim da chuva e que ela vem no fim. Antes ainda tem o frio, o vento e o trovão. Eu já passei por tudo isso. O frio não me congelou, o vento não me levou, e o trovão, sabe Zeus porque, não me acertou.

Além disso, todo-dia, ainda tem a vida. E antes e depois da vida, a morte. E no meio da vida, em meio a tantas outras, tem a minha, que, mais ou menos no meio (um pouquinho pra esquerda) tem uma ferida, a minha ferida.

Por essa ferida é que eu agüentei o frio, fiquei no vento e encarei o trovão. Tudo por ela. Tudo por achar que a chuva ia me lavar, mas a chuva só batia-e-pingava, ela molhava, mas eu secava.

Antes eu até contava as chuvas que eu secava. Antes de perder a conta eu até as contava, mas agora, depois de tudo (mas antes da morte), apenas fico aqui, na verdade, ficamos os três; a vida, a ferida e eu.

A vida para ser vivida, a ferida para ser lavada e - eu.